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Impactos da Proposta de Emenda Constitucional PEC 119/2019 – Estudo Técnico

No último mês, a Senadora Kátia Abreu (PDT-TO) apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição, PEC 119/2019, a qual deve permitir, pelo período de 15 anos, que um terço dos recursos dos Fundos Constitucionais do Norte (FNO), do Nordeste (FNE) e do Centro-Oeste (FCO), possam ser tomadas pelos governos dos Estados dessas regiões. O que, atualmente, a legislação permite que o recurso deva ser somente destinado à iniciativa privada.

Tendo em vista o aspecto prejudicial da proposta aos bancários, a Associação dos Empregados do Banco da Amazônia preparou um estudo técnico explicando seus impactos e expondo seus problemas, comparando-a com a estrutura jurídica, normativa e operacional dos fundos como são atualmente, e considerando três eixos: dotação e repasse dos recursos; pulverização de operação e projetos estruturantes.   

Com o estudo, concluímos que a redução da dotação não se justifica em termos econômicos, bem como termina por punir os bancos regionais, apesar de seu eficaz trabalho de gestão dos fundos, nas últimas décadas. Da mesma forma, provamos que a pulverização operacional inviabiliza a gestão de critérios previstos na lei 7.827 de 1989 e na Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR).

Concluímos também, que o modelo atual já possibilita o financiamento de projetos estruturantes, cabe somente aos Estados proporem tais projetos.

A AEBA encaminhará o estudo aos Senadores para apreciação.

Boa Leitura.

Redução da Dotação dos Fundos

Para iniciarmos este estudo, reproduzimos abaixo, o texto do Art. 159 da CF, excluídos os incisos e as alíneas que não dizem respeito aos Fundos Constitucionais, especificamente, os Fundos Nacionais de Desenvolvimento das Regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste recolhem:

Art. 159. A União entregará:   

“c) três por cento, para aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, através de suas instituições financeiras de caráter regional, de acordo com os planos regionais de desenvolvimento, ficando assegurada ao semiárido do Nordeste a metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer.

  • 1º Para efeito de cálculo da entrega a ser efetuada de acordo com o previsto no inciso I, excluir-se-á a parcela da arrecadação do imposto de renda e proventos de qualquer natureza pertencente aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, nos termos do disposto nos Arts. 157, I, e 158, I.

Art. 161. Cabe à lei complementar:

III – dispor sobre o acompanhamento, pelos beneficiários, do cálculo das quotas e da liberação das participações previstas nos Arts. 157, 158 e 159.”           

De imediato, verifica-se que o repasse aos fundos ocorre somente após excluir-se do montante arrecadado àqueles valores destinados aos Estados e ao DF, na forma do § 1º do Art. 159. Isso implica dizer que, primeiro calcula-se a parte devida ao FPE (Fundo de Participação dos Estados) e posteriormente, retiram-se os 3% dos Fundos Constitucionais. Com isso, evita-se problemas de receita dos estados e garante-se funding (financiamento) para a aplicação em empreendimentos privados no volume que as regiões demandam.

Esses empreendimentos geram aumento da produção e produtividade, postos de trabalho, receita fiscal e permitem ao estado direcionar o desenvolvimento da atividade econômica das regiões. Sua condição de crédito diferenciado tem sido determinante para as economias da Amazônia e do Nordeste.

Infere-se também, que a divisão entre os fundos, conforme o montante de 3% será de 1,8% FNE, 0,6% FNO e 0,6% FCO, de acordo com a garantia de metade dos recursos à região Nordeste. Percebe-se que são alíquotas extremamente baixas, o FNO, por exemplo, é formado por 0,6% do arrecadado com Imposto sobre produtos industrializados (IPI) e Imposto de Rendas (IR).

Porém, à dotação dos fundos somam-se os reembolsos de operações que refletem a efetividade (eficácia e eficiência) das aplicações. Num cenário de queda nas arrecadações, é o reembolso que tem permitido o crescimento da dotação e não os repasses do Tesouro Nacional (TN). É fundamental para o mercado que essa dotação seja crescente para gerar um cenário de disponibilidade de recursos.

A transferência de fundos para os estados certamente não resolverá seus problemas e ainda criará outro para os Bancos Regionais. Ao fazer isso, estaríamos “descobrindo um santo sem cobrir o outro”.

Verifica-se também, que estados e municípios já possuem suas fontes asseguradas de recursos nos referidos Artigos citados acima. Por isso, não faz nenhum sentido ampliar esses recursos pela diminuição da dotação aos agentes privados da economia que chegam a estes via agentes financeiros dos Fundos Constitucionais.

No que se referem à alínea “c”, os recursos seriam destinados exclusivamente para “programas de financiamento ao setor produtivo privado”.

Disso, decorre o necessário reembolso por parte do tomador, isto é, são operações de crédito e não de investimento público. Embora sejam operadas com recursos públicos.

O ponto seguinte refere-se à avaliação do texto em si da PEC 119/2019.

Inicialmente, o texto implica uma redução global de 1% no que se refere ao previsto na alínea “c” do Art. 159 da CF.

Por via de consequência, deverá haver nova divisão entre os fundos que está desta forma prevista no texto da PEC 119/2019.

Quadro 1 – Divisão dos recursos entre os fundos, atual e proposta.

Fundos Constitucionais 

Divisão Atual     Divisão Proposta PEC 119/2019

Valor Global         3%          Valor Global       3%

FNO       0,6%      FNO       0,4%

FNE        1,8%      FNE        1,2%

FCO       0,6%      FCO       0,4%

Setor Público     0%          Setor Público     1,0%

Como se vê no quadro acima, o texto da PEC sugere destinar 1% ao setor público com uma redução proporcional dos valores destinados aos Fundos e geridos pelos Bancos. Com um impacto elevado sobre o FNE. 

Uma das alegações mais importante da PEC está nessa nova divisão dos recursos que doravante seriam destinados ao setor público. Poder-se-á dizer que não haverá perda de recursos para as regiões em forma absoluta de valores, mas apenas pela via institucional de uso desses recursos.

Nesse ponto, a PEC é obscura e pode produzir desordem institucional. Primeiro por que não informa a via de destinação para o setor publico. Não informa se os valores seriam destinados diretamente aos estados ou se por meio de projetos avaliados e geridos pelos Bancos. Isso faz muita diferença. No primeiro caso, esses valores deixariam de ser reembolsáveis e no segundo a Lei 7.872 deveria ser alterada para permitir o financiamento ao setor publico.

Pulverização dos Recursos entre os Agentes 

Outra inovação proposta pela PEC é a de que ficariam autorizados a conceder empréstimos com recursos de que trata a alínea “c” do inciso I do Art. 159 da CF, as seguintes instituições: Banco do Brasil S.A; Banco do Nordeste do Brasil S.A; Banco da Amazônia S.A; Caixa Econômica Federal; Cooperativas de Crédito; Agências Estaduais de Fomento.

Nesse ponto, a PEC 119/2019 incorre em diversos equívocos e fragilidades legais e institucionais. Vamos a eles:

Embora haja no texto um Parágrafo Único que estabeleça os critérios de operação das cooperativas e agencias de fomento: Basiléia I, estrutura operacional e técnica e aderência às normas, o texto da PEC não retira dos Bancos Regionais e do Banco do Brasil a condição de agentes gestores dos fundos de suas respectivas regiões. Os fundos têm personalidade jurídica própria e gestão única que deve atender a exigências legais, inclusive da própria Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), o que nos leva a dois caminhos possíveis: criar uma gestão dos fundos separada dos bancos e para isso, seria necessário transferi-la para um ministério ou manter a gestão no quadro atual, o que implica dizer que toda a estrutura de controles de repasses, de critérios globais de aplicação e de gestão financeira se mantém nos Bancos, ora gestores. 

Não há como pulverizar a gestão dos fundos, isso se caso ocorrer, pode levar a um desvio de finalidade constitucional dos fundos como resultado mesmo da própria PEC. O que não se está vendo é que a alteração da sistemática atual do fundo tem efeitos institucionais que podem ter consequências graves. Pode-se estar criando um problema para não resolver outro.

Por isso, não vemos nenhum sentido em criar um órgão especifico para a gestão dos fundos, logo a gestão deverá se manter nos Bancos. Desdobra-se disso que caberá aos bancos gestores a própria verificação dos critérios de operação para cooperativas e agências. Sendo assim, não há por que se alterar a sistemática atual que já permite repasses e inclusive vai muito além do proposto na PEC, pois estende essa possibilidade aos bancos privados.

No caso das agências de fomento estaduais, cabe aos estados criarem fontes de custeio para seu funcionamento e seus projetos.

A medida proposta pela PEC, neste caso, pode gerar enorme distorção na aplicação dos recursos com crise de papéis institucionais, posto que autoriza a concessão de crédito no âmbito dos fundos a diversos agentes financeiros. Em termos práticos, implica dizer que o Banco da Amazônia, por exemplo, poderá aplicar recursos do FCO e do FNE, porém, o BNB não tem agências na região Norte, o Banco do Brasil, por seu lado, poderá aplicar recursos em todas as três regiões, tornando essa política simplesmente impossível de ser gerida.

Nesse caso, o modelo atual revela-se mais apropriado, uma vez que mantém a gestão centralizada dos fundos, o que por sua vez, assegura sua aderência aos critérios da Lei n. 7.827 de 1989 e da Política Nacional de Desenvolvimento Regional – PNDR.

Financiamento e Obras Estruturantes 

Outro ponto da questão, refere-se ao financiamento de obras estruturantes. Não há nenhum óbice ao financiamento pelos fundos constitucionais de obras estruturantes no âmbito logístico ferroviário, rodoviário e hidroviário ou mesmo de geração e transmissão de energia, ao contrário.

O § 1o  do Art. 4º da Lei 7.827 de 1989 afirma que:

 “Os Fundos Constitucionais de Financiamento poderão financiar empreendimentos de infraestrutura econômica, inclusive os de iniciativa de empresas públicas não dependentes de transferências financeiras do Poder Público, considerados prioritários para a economia em decisão do respectivo conselho deliberativo”.

Entende a lei, neste caso, que as empresas públicas, empresas de econômica mista ou mesmo parcerias público privadas podem ser beneficiárias de créditos no âmbito dos fundos e que projetos de infraestrutura econômica são passiveis de financiamento. Logo, o investimento em tais áreas depende não da forma institucional do financiamento, mas simplesmente de um trabalho de elaboração de estruturação desses projetos pela SUDAN e outros agentes.

Há, por exemplo, na história recente, um elevado número de empreendimentos estruturantes financiados com recursos dos fundos constitucionais.

Não se faz, portanto, necessário alterar as regras dos Fundos para permitir o financiamento dessas atividades.

Conclusões 

A redução dos recursos dos fundos deverá diminuir a disponibilidade de crédito diferenciado para agentes do mercado, isso terá um impacto nos investimento e no potencial de crescimento econômico das regiões. Além de a PEC não deixar claro como será a gestão desses recursos destinados ao setor público.

Os estados possuem fontes de recursos e precisam melhorar a gestão dos mesmos. Os Bancos Regionais tem tido sucesso na gestão dos fundos, mesmo assim, o texto da PEC expressa certa “punição” aos bancos, totalmente injustificada.

A pulverização dos recursos dos fundos inviabiliza a gestão de metas previstas em instrumentos legais e que asseguram a aplicação de modo a atender as premissas do desenvolvimento regional. O modelo atual já abriga a possibilidade de outros agentes entrarem, sem que isso impeça a gestão das diretrizes legais.

E por fim, o financiamento de projetos estruturantes é hoje plenamente possível o que não temos é uma agencia que pense nesses projetos e os desenvolva.

Associação dos Empregados do Banco da Amazônia – AEBA.

1 Comentário
  1. Dorisval de Lima 5 anos ago
    Reply

    Manifesto votos de congratulações à Diretoria da AEBA pela iniciativa. A mesma está coerente com o histórico de luta dessa valorosa Entidade em lutar em defesa dos trabalhadores, pelo fortalecimento BASA (dos órgãos regionais)enquanto estratégia de Desenvolvimento, bem como em defesa do FNO (dos fundos os constitucionais) e do próprio Desenvolvimento Regional. Essa é uma de todos! Vale um Nordeste, um Norte, um Brasil verdadeiramente democrático do ponto de vista político, econômico e social… Nestes termos reafirmamos parceira para as empreitadas. (Dorisval de Lima, Diretor de Comunicação da AFBNB).

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